Opinião Pública – Vol. 24, Nº 1 2018
Artigos desta edição
Autor: Thiago Aparecido Trindade
Este artigo tem como objetivo principal avançar na discussão teórica sobre a relação entre ações de protesto e a deliberação pública, problematizando uma abordagem recente que advoga em favor de uma conciliação analítica entre as duas práticas e entende o protesto como parte do processo deliberativo. A conclusão principal do texto é que a aproximação teórica entre protesto e deliberação é problemática por duas razões principais: i) alarga excessivamente o conceito de deliberação, retirando-lhe grande parte de seu poder explicativo; e ii) elimina a clivagem entre a política disruptiva e a política convencional. Nesse sentido, o presente artigo procura dar continuidade a um dos temas que tem conquistado cada vez mais atenção no âmbito da escola deliberacionista, questionando qual a forma mais apropriada para pensarmos a relação entre as práticas deliberativas e as ações de protesto.
Autor: Camila Rocha
O objetivo do presente artigo é analisar as percepções políticas e as escolhas eleitorais de eleitores da periferia de São Paulo que ascenderam socialmente durante os governos Lula, tendo em vista o declínio do petismo e o surgimento do lulismo. Eles teriam relacionado sua ascensão social com as políticas governamentais dos governos Lula? Seriam lulistas? Caso fossem, o que isso significaria e qual impacto teria em suas percepções acerca do Partido dos Trabalhadores? De acordo com os dados levantados a partir de uma série de entrevistas em profundidade realizadas junto a moradores do bairro da Brasilândia entre 2011 e 2013, as motivações da preferência pelo PT e/ou por Lula não foram de ordem material, mas sim de ordem simbólica, tendo em vista os benefícios recebidos pela população mais pobre que habita o Nordeste brasileiro. Contudo, a despeito de tal identificação, a adesão ao PT e ao lulismo na periferia possui fragilidades importantes.
Autores: André Borges e Robert Vidigal
O debate recente sobre identificação partidária e comportamento eleitoral no Brasil vem apontando para a crescente importância do posicionamento dos eleitores com respeito aos principais partidos presidenciais – PT e PSDB – na escolha dos candidatos à presidência. Neste artigo, procura-se contribuir para a literatura colocando em questionamento diagnósticos recentes com respeito à polarização do sistema partidário presidencial. De acordo com a hipótese da polarização, a competição eleitoral entre PT e PSDB levou a uma crescente divisão do eleitorado em dois blocos claramente diferenciados e polarizados. Argumentamos que esta hipótese se apoia em bases teóricas e empíricas frágeis. Não obstante a crescente importância dos sentimentos partidários na determinação do comportamento dos eleitores no pleito presidencial, os resultados das análises descritivas e modelos estatísticos multivariados com base nos surveys do Estudo Eleitoral Brasileiro (Eseb) realizados nos anos de 2002, 2006, 2010 e 2014 demonstram que não há evidências de que tal movimento estaria associado a um aumento da polarização partidária de massa. Pelo contrário, observamos que as diferenças ideológicas e de opinião entre petistas e tucanos são de pequena monta e, além disso, encontramos evidências de uma crescente convergência ideológica entre os vários segmentos do eleitorado ao longo do tempo.
Autores: Pedro Santos Mundim , Wladimir Gramacho e André Jácomo de Paula Pinto
O artigo analisa os efeitos dos juízos cognitivos e das reações emocionais ao estado da economia brasileira e das finanças pessoais de entrevistados em dois surveys sobre a aprovação do governo federal. Com base na teoria da inteligência afetiva, o artigo mensura e compara a influência dessas duas perspectivas sobre a opinião pública brasileira em dois contextos distintos. Em novembro de 2014, a presidente Dilma Rousseff havia sido recém-reeleita e a percepção predominante sobre o estado da economia era satisfatória. Já em abril de 2015, o governo havia anunciado duras medidas de ajuste fiscal e aumento de preços públicos, alterando de modo relevante a opinião da sociedade brasileira sobre o contexto econômico. Nossos resultados confirmam a expectativa de que razão e emoção atuam de modo complementar na formação da opinião sobre o governo federal e que, em tempos de crise, a influência relativa das emoções é maior.
Autor: Mads Damgaard
Fazendo uma análise de conteúdo de seis meses de manchetes em três jornais brasileiros, além de 8.800 notícias sobre corrupção e transgressão política, o artigo estuda o viés da atenção midiática para vários escândalos de corrupção em 2015-2016. Esse viés é examinado como um fenômeno de informação, decorrente de fatores sistêmicos e comerciais no sistema de mídia brasileira: uma cascata de informação sobre corrupção emergiu, desestabilizando a coalizão de governo e legitimando o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Com o ímpeto crescente desse processo, questões de accountability foram desconsideradas pela mídia, com efeitos nocivos para a democracia.
Autores: Dolores Rocca Rivarola e Nicole Marina Moscovich
O artigo propõe uma interpretação comparativa sobre o lugar visualmente atribuído nas campanhas eleitorais de Cristina Fernández de Kirchner (2007 e 2011) e Dilma Rousseff (2010 e 2014) à militância pró-governo como um coletivo mobilizado e uma sustentação organizada. Isso, depois de sucessivas campanhas que privilegiaram uma imagem diferente: aquela do candidato em uma ligação direta, e sem mediações, com a cidadania. O levantamento de material empírico consiste em uma seleção de spots na Argentina e de todos os programas eleitorais do HGPE (Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral) no Brasil. A partir da análise de conteúdo qualitativa da propaganda eleitoral, observa-se uma maior hierarquização visual do coletivo militante nas campanhas de 2011 (Argentina) e 2014 (Brasil), em comparação com as duas anteriores (2007 e 2010). E, para o caso brasileiro, o artigo destaca a introdução na campanha de 2014 de um segundo modo de representação da militância, através de referências à trajetória de Dilma como ativista juvenil durante a ditadura militar.
Autores: Celi Regina J. Pinto e Augusta Silveira
O artigo analisa a trajetória política de 62 mulheres que, ao longo de 17 legislaturas, exerceram no mínimo três mandatos de deputadas, sendo pelo menos um como deputada federal, com o objetivo de responder a seguinte questão: quais são os requisitos necessários para as mulheres chegarem a ter carreiras parlamentares exitosas em um país que está em 151° entre os 187 países analisados quanto à participação das mulheres nos parlamentos em 2017? O artigo está dividido em duas sessões: a primeira faz um apanhado geral do universo das mulheres eleitas deputadas estaduais e federais entre 1950-2014, no total de 653 deputadas; a segunda ocupa-se das 62, foco central do trabalho. A análise da trajetória das 62 deputadas demonstrou que suas carreiras políticas longevas seguem caminhos tradicionais de políticos homens e este achado constitui-se uma das principais razões da escassa presença das mulheres na vida política brasileira.
Autores: Marcio de Lucas Gomes e Jakson Alves de Aquino
A democracia é um regime político que está relacionado não apenas ao cumprimento de procedimentos, mas também a valores e comportamentos. Uma de suas bases são redes de confiança interpessoal que fundamentam a cooperação entre indivíduos. Dado que o sistema democrático funciona como um mecanismo de resolução de problemas de ação coletiva, alocando recursos dos cidadãos para prover bens públicos, a satisfação de alguém com o regime envolve a percepção sobre as atitudes das outras pessoas, ou seja, se estão cooperando ou não para a sociedade. Além disso, a eficiência institucional também tem impacto sobre a opinião pública: democracias que não provêm bens públicos satisfatoriamente tendem a contar com menor apoio popular. Neste artigo, investigamos os efeitos de variáveis criminológicas sobre a satisfação com a democracia no Brasil, testando a hipótese quanto à presença de duplo vetor de efeitos: um direto – reduzindo apoio instrumental ao regime – e outro indireto – reduzindo confiança interpessoal. Para isso, utilizamos dados do Barômetro das Américas, de 2014. Testes feitos com modelos de regressão linear, equações simultâneas e modelos não paramétricos corroboraram a hipótese. Entretanto, modelos de mediação causal, uma forma mais rigorosa de testar a hipótese, revelaram não haver efeitos indiretos significativos.