Opinião Pública – Vol. 16, Nº 2 2010
Artigos desta edição
Autor: José Álvaro Moisés
20 anos depois de reinstalada a democracia no Brasil, a maioria dos brasileiros apóia o regime, mas desconfia das instituições democráticas. O artigo examina os significados atribuídos à democracia por pessoas comuns com base na análise das respostas à pergunta aberta "O que é democracia". O estudo se baseia em análises bivariadas e multivariadas de dados de pesquisas coordenadas pelo autor em 1989, 1990, 1993 e 2006. Os testes tiveram por objetivo verificar os significados mais importantes do conceito, assim como os seus determinantes, de modo a permitir um conhecimento mais aprofundado sobre a crescente adesão normativa dos brasileiros à democracia. Os resultados mostram que os brasileiros definem a democracia em termos tanto de liberdades como de procedimentos institucionais; surpreendentemente, o conteúdo relativo à dimensão social da democracia tem pouco impacto nos resultados. Ao longo de quase 20 anos, os brasileiros confirmam a sua crescente adesão à democracia, e combinam sobre o conceito uma ideia normativa com outra de natureza pragmática, mas que se refere à função das instituições. Isoladas, essas dimensões dizem pouco, mas, juntas, definem a natureza singular do processo democrático e têm relação com a sua qualidade.
Autores: Sonia Luiza Terron e Gláucio Ary Dillon Soares
O debate sobre o distanciamento entre Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT) ganhou corpo na eleição de 2006, quando a popularidade de Lula e de seu governo não se estendeu ao PT, como seria esperado. Pela primeira vez o partido não melhorou o desempenho na votação para a Câmara dos Deputados em relação à eleição anterior. Analisamos as bases eleitorais de Lula e do PT nas quatro últimas eleições para presidente e deputado federal (1994-2006), e comprovamos o distanciamento entre elas. Pesquisamos a distribuição espacial das votações ao nível do município com mapas, estatísticas e regressões espaciais. Identificamos o “descolamento” dos territórios eleitorais do candidato e do partido a cada eleição, e as regressões espaciais mediram a crescente independência espaço-temporal das votações: os coeficientes baixaram de 0,85 em 1994, para 0,15 em 2006. Houve um processo de distanciamento geossocial, no período de 1994 a 2002, e um “divórcio” entre as bases eleitorais, em 2006, quando se formaram territórios de configurações praticamente irrelacionadas.
Autores: Daniel Jaime Capistrano e Henrique Carlos de O. Castro
A opinião e a orientação de argentinos e brasileiros em relação à política e ao Estado têm mudado nos últimos vinte anos? Transformações sociais ocorridas nesse período sugerem que a cultura política nesses países experimentou alterações importantes. O presente artigo aborda esse tema com ênfase no apoio público à intervenção do Estado na economia. Os resultados da pesquisa corroboram a lógica de transformação na cultura política, mas apresentam um padrão de valorização da ação do Estado que não é considerado no debate atual. Esse padrão pode ser explicado por aspectos históricos, sociais e políticos específicos dos países latinoamericanos.
Autores: Leany Barreiro Lemos, Daniel Marcelino e João Henrique Pederiva
Muitos trabalhos estudam a relação entre dinheiro e eleições, especialmente como o aporte de recursos pode explicar o sucesso do candidato. Nosso artigo tem como objetivo identificar aspectos do financiamento de campanha nas eleições para o Congresso Nacional brasileiro, nos anos de 2002 e 2006, com base nos dados do TSE. Buscamos captar: a) diferenças nas receitas e gastos entre candidatos à reeleição e novos candidatos; b) variações regionais, dadas as profundas clivagens socioeconômicas dos distritos eleitorais, que podem afetar as contribuições e despesas realizadas; c) variações camerais, dada a incongruência do bicameralismo brasileiro; d) variações partidárias, ou seja, se há candidatos cujas campanhas saem mais "caras" ou mais "baratas", a depender do partido politico.
Autor: Pedro Santos Mundim
Este artigo apresenta a construção e o teste de um modelo voltado para medir o efeito da cobertura da imprensa no voto dos eleitores. O período de análise são as eleições presidenciais de 2002 e 2006. A variável dependente são as séries históricas de intenção de voto dos principais candidatos. A variável explicativa de maior interesse foi construída a partir da análise de conteúdo da cobertura eleitoral de quatro grandes jornais do país: Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, O Globo e Jornal do Brasil. Os resultados dos testes indicaram que o modelo funcionou satisfatoriamente e que a cobertura da imprensa foi, sim, um fator importante das disputas eleitorais de 2002 e 2006. Em ambos os pleitos as intenções de voto de seis dos oito principais candidatos ao cargo de Presidente da República foram afetadas pelos fluxos de informação provenientes da cobertura da imprensa.
Autor: Camilo Aggio
A utilização de recursos e ferramentas digitais associados à Internet por parte de campanhas eleitorais empreendidas por candidatos e partidos tem ganhado uma importância crescente nos últimos anos, produzindo casos emblemáticos como a eleição de Barack Obama nos Estados Unidos em 2008. O presente artigo tem o propósito de realizar um exercício de organização da literatura formada em torno das campanhas online, mostrando como as questões, problemas e discussões acerca do tema se modificaram ou se reconfiguraram ao longo dos anos. Ainda que poucos trabalhos tenham sido produzidos no Brasil até agora, o conjunto de questões levantadas para abordar o fenômeno das campanhas online em outros contextos culturais e políticos é essencial para a reflexão sobre os potenciais e obstáculos dessa comunicação política digital no contexto brasileiro. A metodologia consistiu no levantamento de bibliografia e em uma classificação desses trabalhos de acordo com o ano do corpus de análise. Nossos resultados indicam que, à medida da passagem dos anos, o discurso, as preocupações e as experiências empíricas relacionadas às campanhas online direcionaram seu foco para os potenciais de mobilização, engajamento e ativismo relacionados às características da web 2.0, reconfigurando os potenciais de provimento de informações não mediadas pelos media noticiosos e interatividade no plano dialógico característicos da fase dedicada aos web sites de campanha.
Autores: Rafael Cardoso Sampaio, Rousiley Celi Moreira Maia e Francisco Paulo Jamil Almeida Marques
Esse artigo busca avaliar trocas discursivas realizadas no fórum online do orçamento participativo digital (OPD) de Belo Horizonte, Brasil. Para tanto, é formulado um modelo de análise das discussões entre os cidadãos participantes do programa baseado nas teorias de democracia deliberativa. São analisadas as mensagens dos usuários (n=375) postadas na ferramenta de comentários do site do OPD. Os resultados apontam que os aspectos discursivos concernentes à reciprocidade e à reflexividade se mostraram relativamente escassos; entretanto, o respeito pelos outros interlocutores, bem como a construção da justificativa dos pontos de vista expressos no fórum, alcançaram índices elevados, mesmo não havendo empowerment da ferramenta ou incentivo por parte da Prefeitura. Conclui-se que a internet pode, efetivamente, oferecer ambientes voltados para o estabelecimento de trocas discursivas qualificadas e que, mesmo nos casos onde há baixos índices de deliberatividade, há progressos importantes do ponto de vista do aprendizado a que são expostos os usuários.
Autores: Edison Nunes, Félix Sanches e Vera Chaia
O presente artigo tem como objetivo apresentar uma caracterização da cultura política na Região Metropolitana de São Paulo, analisando atitudes e percepções em torno do sistema político; formas de exercício de cidadania e disponibilidade para o associativismo e ação política. Discute duas hipóteses concorrentes, não excludentes: 1) a clássica interrogação de natureza sociológica da relação entre o contexto socioeconômico e urbano e a cultura política e 2) a consideração de tal processo como fortemente influenciado pela história política local e sua conexão com o nacional. Privilegia a experiência política dos cidadãos como variável independente em relação à cultura política e que se apresenta uma causação cruzada entre o marco institucional e os pressupostos pelos quais os agentes formulam suas preferências.
Autor: Jairo Pimentel Jr.
Este artigo tem como proposta analisar o papel dos sentimentos na estruturação das escolhas eleitorais durante a eleição presidencial brasileira de 2006. Especificamente, analisa de que forma as emoções dos eleitores em relação aos candidatos afetam e estimulam a avaliação e o voto nos mesmos. Primeiramente, buscamos demonstrar formas de mensuração das emoções em termos quantitativos através de surveys realizados durante o período eleitoral. Em segundo lugar, buscamos evidenciar que a avaliação retrospectiva pode ser mais bem entendida se compreendermos como a avaliação de governo interage com os estados emocionais dos eleitores. Destarte, negando a longa tradição que contrapõe razão e emoção dentro da política, salientamos a tese de que os sentimentos constituem uma importante variável no processamento de informações e, consequentemente, na decisão do voto.
Autor: Danilo Enrico Martuscelli
Este artigo analisa a tática política adotada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na conjuntura de crise do governo Collor (1990-1992). Considera-se que o PT não tenha fugido à tendência dominante do movimento pró-impeachment, vindo a aderir à campanha pela ética na política e a atacar o presidente Collor a partir de um discurso de cunho moralista que menosprezou a crítica e a denúncia do caráter de classe da política neoliberal, satisfazendo-se apenas com a denúncia da política recessiva do governo. Essa tática se inscreve na luta contra os efeitos da política neoliberal e não propriamente contra essa política, e esse comportamento político pode ser considerado um indicador do processo de aceitação passiva, por parte do PT, das medidas neoliberais.
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