Vol. 04, nº 2, 1997

TENDENCIES - Perceptions about AIDS in Brazil and the United States

Resumo

A AIDS vem chamando a atenção do público desde o início dos anos 80, quando os meios de comunicação passaram a divulgar amplamente o surgimento de uma nova doença fatal e misteriosa que atingiria os homossexuais masculinos. Num primeiro momento, com o crescimento geométrico de casos notificados da doença em todo o mundo, os grupos de risco se multiplicaram, e a AIDS passou a afetar também outros segmentos como os hemofílicos, os viciados em drogas injetáveis e os receptores de sangue através de transfusão. Mas, num segundo momento, as formas de contágio, principalmente sexual e através do sangue, quebraram as barreiras entre os grupos, dando uma dimensão epidêmica para a doença. Os dados apresentados no Tendências 10, retirados de pesquisas realizadas no Brasil e nos Estados Unidos, mostram que as pessoas estão cada vez menos indiferentes à AIDS. A conscientização da população brasileira é um dado importante no conjunto de pesquisas, onde se observa um crescimento contínuo nos índices de entrevistados que se consideram mais informados sobre a doença. Isto é válido tanto para a população em geral quanto para os públicos específicos, os chamados grupos de risco. Interessante notar que os altos índices observados para o público brasileiro encontram-se no mesmo patamar dos observados junto ao público norte-americano. Dados mais específicos confirmam este indicador de conscientização. Pode-se observar que as formas mais prováveis de contágio – sexual e sanguínea – são de conhecimento quase unânime nas populações pesquisadas. No entanto, também se observa que uma parcela significativa de entrevistados brasileiros acredita que a AIDS pode ser transmitida através de formas corriqueiras, como, por exemplo, em piscinas, toaletes públicos e através de picadas de mosquitos. Essas crenças e opiniões parecem colaborar de forma significativa para os elevados índices de entrevistados brasileiros que dizem ter medo de contrair AIDS. Quanto a esse aspecto, os entrevistados norte-americanos mostram-se bem menos receosos. Este cenário global é indicador das mudanças de comportamento observadas: de fato, em todo o período pesquisado, o índice de pessoas que declaram ter mudado o comportamento devido ao aparecimento da doença praticamente duplica. Os aspectos mais afetados dizem respeito aos hábitos sexuais, como a maior seletividade na escolha de parceiros e uso de preservativos. Neste conjunto, o maior peso na composição do índice positivo de mudança de comportamento deve-se às respostas dos entrevistados do sexo masculino, solteiros, com idade entre 16 e 25 anos, grupo que está incluído na faixa dos mais afetados pela doença, segundo os dados recentes do Ministério da Saúde (Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde – Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS, 1996). Os dados também mostram mudanças pontuais no comportamento dos chamados grupos de risco – homossexuais e prostitutas –, principalmente quanto ao uso de preservativos e também à maior seletividade na escolha de parceiros. As pesquisas não captam informações sobre mudanças de comportamento em relação ao uso de drogas injetáveis, sabidamente uma das principais formas de contágio. Talvez, por tratar-se de uma questão definida no campo da ilegalidade, é de se supor que a obtenção de dados sobre esses hábitos necessite de uma abordagem específica. Apesar do avanço da doença de forma generalizada na sociedade e da crescente conscientização mostrada pelo público em geral e os chamados grupos de risco, os dados apresentados no encarte mostram que a AIDS ainda aparece fortemente associada aos homossexuais e/ou hábitos sexuais. Opiniões colhidas pelo IBOPE em todo o país, em 1993, mostram que a população se divide igualmente sobre a hipótese dos homossexuais terem provocado o aparecimento da AIDS, e a maioria absoluta considera que eles são os responsáveis pela disseminação da AIDS pelo mundo. Corrobora para isto o peso maior das opiniões neste sentido colhidas no interior do país. Observa-se que à medida em que se caminha da capital, passando pela periferia dos grandes centros em direção ao interior, crescem os índices de entrevistados que atribuem aos homossexuais a responsabilidade pelo surgimento e disseminação da AIDS. Outros dados mostram a forte associação de opiniões sobre os chamados hábitos sexuais “promíscuos” e a AIDS. Mesmo não compondo a maioria, é significativo que cerca de 30% de entrevistados paulistanos concordam que “só pega AIDS sexualmente quem é promíscuo” e que “a AIDS pode ser uma punição de Deus para quem tem comportamento sexual imoral”. Vale destacar também que, apesar da ampla divulgação pela mídia de dados oficiais sobre disseminação da AIDS pela população em geral, ainda assim mais de 80% concordam com a afirmativa de que “no Brasil a AIDS transmitida sexualmente continua crescendo principalmente entre homens bissexuais e homossexuais e prostitutas”. Para os dados norte-americanos, também é possível observar alguns indicadores de disseminação da AIDS. A série de pesquisas mostra que há um crescimento constante do número de pessoas que conhecem alguém portador de AIDS, bem como o de entrevistados que já fizeram teste de sangue para detectar o vírus HIV. Numa pesquisa realizada em 1993, os homossexuais apareciam, na opinião de quase totalidade dos entrevistados, como o principal grupo de risco da doença. Apesar de não haver dados mais recentes com um mesmo enunciado, uma pesquisa de 1987 mostra opiniões que sugerem certa preocupação com a disseminação da doença para outros grupos. A maioria dos entrevistados na época apoiava medidas preventivas, como o direito de patrões fazerem teste para detectar o vírus em empregados; a exigência do mesmo teste para casais antes do casamento; e a existência de programas para o encorajamento do teste entre homens e mulheres sexualmente ativos. De uma maneira geral, os norte-americanos declaram-se bastante tolerantes com relação à convivência com os portadores do vírus. Essa percepção surge nas opiniões favoráveis à presença de indivíduos soro-positivos no ambiente profissional, nas escolas e mesmo quando no apoio à volta do atleta Magic Johnson ao basquete profissional. Nessa mesma direção é pequeno o índice dos que concordam com idéias conservadoras, punitivas do tipo: “a AIDS vem de Deus para punir o comportamento homossexual”. Esta mesma tendência não aparece quando o portador de AIDS é um imigrante ou estrangeiro: a maioria absoluta dos entrevistados em 1987 e 1993 considera que a entrada de estrangeiros com AIDS deveria ser proibida no país. Finalmente, apresentamos algumas percepções sobre as políticas de prevenção da AIDS. Este aspecto aparece mais claramente nas opiniões do público norte-americano que, de forma significativa, manifesta estar percebendo avanços na luta contra a doença de uma forma geral, e junto a grupos específicos. Em relação ao Brasil, uma pesquisa de 1993 mostra que na opinião da maioria absoluta dos entrevistados a atuação do governo estava muito aquém do necessário na luta contra a AIDS. Não obstante, faltam dados mais recentes para avaliar se os últimos esforços neste sentido estão sendo percebidos pela opinião pública.

Palavras-chave

AIDS; acesso à informação; sexualidade

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