Opinião Pública – Vol. 23, Nº 2 2017
Artigos desta edição
Autores: Luciana Fernandes Veiga, Ednaldo Ribeiro, María Alejandra Nicolás e Rachel Callai Bragatto
Este artigo refere-se a um paradoxo hoje presente na América Latina e no Caribe: verifica-se o aumento progressivo da adesão à democracia mas uma crescente diminuição da satisfação com o sistema. O fator temporal poderia explicar essa contradição? O artigo apresenta como a idade dos cidadãos e os anos de experiência democrática das nações influenciam nas disposições individuas em relação à democracia em termos de apoios difuso e específico. Aplicamos análise fatorial e um modelo multinível de regressão multivariada. Nossos resultados demonstram a relação entre a experiência com o regime democrático e o apoio às dimensões mais difusas da legitimidade, porém isso não se confirmou nas dimensões mais específicas.
Autores: Mario Fuks, Gabriel Avila Casalecchi e Mateus Morais Araújo
Vários estudos utilizam os termos “cidadão crítico” e “democrata insatisfeito” de forma intercambiável, assumindo que ambos abordam o mesmo perfil de cidadão. No entanto, estudos recentes conduzidos em novas democracias questionaram essa suposição, argumentando que aqueles que estão insatisfeitos nem sempre são críticos. Este artigo investiga essa questão com base numa comparação entre os Estados Unidos e o Brasil. A partir da criação de dois tipos de cidadãos, o democrata insatisfeito e o democrata crítico, nós avaliamos se os democratas insatisfeitos são também críticos. Em seguida, testamos qual dos dois tipos de cidadão é mais engajado e tem atitudes mais democráticas. Os resultados mostram que os democratas insatisfeitos não são necessariamente críticos e que os democratas críticos estão mais engajados na política e mais comprometidos com a democracia do que os democratas não críticos.
Autor: Eduardo Alves Lazzari
Por que os brasileiros não confiam em partidos políticos? Essa é a pergunta-chave deste artigo. Analisa-se essa pergunta com a mobilização de hipóteses da área, englobando argumentos racionalistas e culturalistas. Para respondê-la, utiliza-se de survey representativo da população brasileira e conduzido pelo Nupps/USP em 2014, em que regressões logísticas ordinais são executadas. Os resultados mostram, em primeiro lugar, que hipóteses avaliativas e a confiança interpessoal são os condicionantes dessa atitude no país. Em segundo lugar, observa-se que os efeitos dessas hipóteses são assimétricos, levando a uma reflexão acerca das diferenças conceituais entre desconfiança e confiança em partidos no Brasil para um melhor entendimento das dinâmicas da representação no país.
Autores: Lígia Helena Hahn Lüchmann, Márcia Inês Schaefer e André Selayaran Nicoletti
Respaldado pelos estudos no campo da sociologia política e em diálogo com as teorias sobre o associativismo e suas relações com a democracia, este artigo visa testar os esforços de tipificação do campo associativo tendo em conta a adoção de repertórios de atuação político-institucional. Mobilizando o conceito de associativismo em articulação com a ideia de ecologia democrática das associações, o artigo busca sistematizar os resultados de uma pesquisa junto ao associativismo de Florianópolis, que decompõe as suas práticas em dois tipos de repertórios ainda pouco explorados, a saber: o de ação voltado para a mobilização do direito, com destaque às ações civis públicas; e o de representação das associações junto aos conselhos gestores de políticas públicas. De maneira geral, nossos dados confirmaram uma importante presença do associativismo no uso desses repertórios, indicando que, embora a grande maioria ocupe assento nos diferentes conselhos da cidade, tem crescido o número de associações que ingressam com ações civis públicas, com destaque às associações de defesa de direitos. Os dados também indicam que tipos diferentes de associações mobilizam repertórios comuns e, embora haja variação no universo associativo mapeado, as organizações do mundo do trabalho (sindicatos e associações profissionais) e as associações de base territorial se destacaram no uso desses dois repertórios.
Autores: Ludmila Mendonça Lopes Ribeiro, Rafael Lacerda Silveira Rocha e Vinícius Assis Couto
Neste artigo procuramos compreender como as Varas Criminais de Tóxicos da cidade de Belo Horizonte aplicam a Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). Levando em conta as reconhecidas limitações inerentes aos registros oficiais, nosso objetivo é problematizar os limites e as possibilidades de entendimento do que ocorre com o indivíduo uma vez nas malhas da justiça a partir do banco de dados cedido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, referente a todos os procedimentos enquadrados na Lei de Drogas e encerrados na capital, entre janeiro de 2008 e setembro de 2015. Argumentamos que as Varas de Tóxicos funcionam como justiça em linha de montagem, especialmente, nos casos iniciados por flagrante, ainda que isso signifique supressão de direitos do acusado.
Autor: Victor Araújo
A formação de governos multipartidários potencializa o risco de assimetria de informação entre principals e agentes, de maneira que os conflitos do gabinete sobre políticas se refletem no comportamento dos partidos no parlamento. Diversos estudos demonstram que o controle mútuo entre os partidos integrantes do gabinete é uma forma de compensar a perda de informação inerente à delegação. Enquanto a literatura costuma focar na fase de formulação das políticas, analisando os governos formados no Brasil entre 1995 e 2014, argumento que existe um conjunto mais diversificado de estratégias que permitem aos partidos escrutinar as políticas implementadas por seus parceiros de gabinete. Fazendo uso de análise de redes e técnicas quantitativas de análise de texto (método Gibbs Sampling, algoritmo bayesiano derivado do Latent Dirichlet allocation – LDA) mostro que, nas situações em que os portfólios ministeriais são distribuídos para atores com distintas preferências sobre políticas, os partidos intensificam o uso dos Requerimentos de Informação (RIC) para monitorar os ministérios e políticas que lhes interessam. A estrutura das redes de controle intragabinete varia em função da saliência dos ministérios: os partidos responsáveis pelos portfólios com maior dotação orçamentária são os atores com maior grau de centralidade nas redes de monitoramento mútuo.
Autores: Isabele Batista Mitozo , Michele Goulart Massuchin e Fernanda Cavassana de Carvalho
Experiências interativas online têm estimulado o desenvolvimento de debate público. O Facebook (FB), por exemplo, atrai tanto indivíduos quanto instituições, tais como empresas jornalísticas, que veem na ferramenta a oportunidade de maior contato com a audiência. Com base nisso, este artigo investiga as características do debate público acerca da eleição presidencial de 2014, a partir de postagens nas páginas oficiais dos três maiores jornais brasileiros (Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo) no FB. Assim, observaram-se: 1) intensidade do debate, 2) postura do comentador (reciprocidade), 3) justificativa dos comentários e 4) reflexividade em 610.660 comentários. Dentre os principais resultados, pode-se destacar predominância de comentários monológicos e com baixa justificação. Todavia, o FB pode ser considerado um espaço de persuasão, o que predominou nos comentários.
Autores: Mauro Cerbino , Marcia Maluf e Isabel Ramos
Este artigo analisa o dispositivo de comunicação política denominado Enlace Ciudadano conduzido semanalmente pelo presidente equatoriano Rafael Correa e transmitido por rádio e televisão, com a finalidade de caracterizar os sentidos de construção dos cidadãos em torno das ações do governo, suas relações com a mídia, as formas de comunicação política, suas propostas e as relações com outros atuantes políticos afins e opositores. Através de um estudo qualitativo que combinou a análise do discurso e estudos de recepção, comprovou-se que o discurso presidencial promoveu nas audiências a geração de novos julgamentos e significados ao pensar na política e na relação dos cidadãos com o Estado e os meios de comunicação. O artigo mostra as diversas racionalidades e interpretações de cidadãos que são ao mesmo tempo destinatários e receptores ativos do discurso político. Esses resultados abordam alguns pontos-chave dos processos político-culturais que estão na base da manutenção que os presidentes denominados pejorativamente de “populistas”, como Rafael Correa, conseguiram na população de seus países, em particular entre os setores econômico e social mais desfavorecidos. Eles contribuem para a formação de subjetividades que reconhecem o valor de identidade, direitos, autoestima, e a necessidade de relações menos desiguais, também deixando uma porta aberta para a diferença e o confronto político. Além disso, o artigo promove a discussão ao redor do significado político do sentido comum na configuração da hegemonia no contexto contemporâneo caracterizado pela midiatização da política.
Autor: Cinthia Regina Campos Ricardo da Silva
A União Europeia delega à Comissão Europeia poder exclusivo de iniciativa legislativa, o que permite que um organismo autônomo e pautado pelo senso de expertise possua legitimidade institucional para propor leis que contrariem interesses dos governos nacionais. A partir da análise da demissão voluntária da Comissão Santer e do processo de nomeação da Comissão Barroso, o artigo identifica um empoderamento do Parlamento Europeu principalmente no controle ex-ante da Comissão Europeia, quando confirma a escolha dos comissários, enquanto o poder de controle ex-post tem sido delegado ao presidente da Comissão, que tem se tornado um agente importante no gerenciamento de crises.