Opinião Pública – Vol. 01, Nº 1 1993
Artigos desta edição
Autor: Marcus Figueiredo
O autor analisa os resultados dos Plebiscitos de 1963 e 1993 para o sistema de governo no Brasil e mostra as diferenças de envolvimento político do eleitorado nas duas situações.
Autor: Ronald Inglehart
Este artigo analisa o processo de democratização nas sociedades industriais e identifica aspectos da estabilidade democrática. Argumenta que a mobilização cognitiva, assim como fatores culturais são cruciais à democracia estável, e que a presença de valores pós-materialistas, bem-estar subjetivo e confiança são fortemente associados a ela. O vínculo entre desenvolvimento econômico e democracia estável existe porque o primeiro leva à cultura política pró-democrática.
Autores: José Álvaro Moisés e Gustavo Venturi
O artigo analisa a frágil relação existente entre o apoio à democracia e as instituições democráticas no Brasil. Os dados são de surveys realizados entre 1989 e 1993 no país.
Autores:
A Revisão Constitucional de outubro de 1993 recoloca na cena pública nacional a discussão sobre os mecanismos necessários à consolidação democrática no país. Se há cinco anos podia se argumentar que a Carta Constitucional de 1998 balizava e garantia os requisitos legais para a transição política, social e econômica desejada, o fato é que o fracasso dos processos políticos e econômicos observados nos últimos anos revela as distorções sob as quais a atual Constituição foi elaborada, multiplicando as deficiências do Estado, sobretudo na esfera social, e tornando ainda mais frágil o nosso sistema representativo.
As regras para a criação e funcionamento dos partidos, a fidelidade partidária, o sistema eleitoral e a proporcionalidade na composição da Câmara de Deputados são alguns dos elementos eleitos para discussão e mudanças, dado que apontam para a real institucionalização do sistema representativo, aperfeiçoando os mecanismos da dinâmica eleitoral, o funcionamento parlamentar e as bases institucionais para superação das práticas populistas personalistas.
No campo social, apesar do atual texto constitucional ter procurado traduzir o ideal de justiça social em mecanismos de diminuição das desigualdades, a definição das responsabilidades públicas não se combinou à capacidade estrutural do Estado, conformando um quadro deficitário quanto à equipamentos, funcionamento e acesso aos serviços básicos.
Assim, as políticas sociais da transição traduziram-se, na sua maior parte, em ações puramente assistenciais, não contribuindo para a ampliação real da cidadania.
A opção pela manutenção da República Presidencialista no Plebiscito de abril de 1993 reforça a necessidade das transformações do sistema representativo e as mudanças em direção à reestruturação do Estado, dada a autonomia decisória que este sistema confere ao Presidente da República para promover o desenvolvimento e a reforma social.
Estes são dilemas que unificam grande parte da América Latina a partir da década de 1980. A rigor, sob ótica comparada, nesta década pode-se reunir boa parte dos países do Cone Sul em torno de dois cenários de transformação, quais sejam, no campo econômico, a depressão generalizada e a depressão dos indicadores de crescimento e de superação do quadro social deficitário; e, no campo político, o desenvolvimento de processos democratizantes, que estabelecem parâmetros mínimos de institucionalização de procedimentos e que deram garantias à recomposição da dinâmica política, econômica e social de vários países. Contudo, se no início da década de 1990 a questão democrática aparece reequacionada para os vários países, apenas Chile e Argentina apresentam suas economias recuperadas.
A comparação recente indica ainda que as formas buscadas nos vários países para superação da crise generalizada apontam para soluções convergentes, sobretudo quanto ao papel econômico do Estado e sua reestruturação. As intervenções mal sucedidas do Estado em economias nacionais na década de 1980 estimularam ações e iniciativas para redução de seu papel, através de fórmulas para sua racionalização, combinadas à expansão e fortalecimento do setor privado.
Assim, na arena econômica, os processos de desestatização e privatização conformam dois dos primeiros vetores da reestruturação estatal, sobretudo no que diz respeito à redefinição das ações sociais e reestruturação dos serviços públicos.
Na arena política, a fragilidade dos processos recentes de transição tem desembocado no reforço a práticas populistas, pondo em xeque o papel das instituições e organizações representativas.
Os dados de opinião comparativos de países do Cone Sul apresentados neste encarte Tendências sugerem que as democracias constituídas na última década garantem procedimentos, antes que a consolidação de bases institucionais organizadas de representação. É dada preferência à dinâmica eleitoral e à satisfação das necessidades econômicas como elementos básicos para a democracia, sugerindo certo comprometimento entre os processos de democratização e as soluções para a crise econômica e social que se agrava no continente desde a última década.
A preferência generalizada pela ampliação do papel do Estado, sobretudo na organização e desempenho dos serviços básicos parece ser o eixo que orienta as opiniões quanto ao processo de reestruturação produtiva estatal e ao desenvolvimento do conjunto de políticas e iniciativas no campo social.
O caso brasileiro se destaca neste quadro comparativo. As debilidades de nosso sistema representativo se traduzem na menor importância dada aos partidos políticos e à participação em organizações reivindicativas.
A ilegitimidade da estrutura de representação política existente e da própria democracia traduz-se na pouca confiança conferida aos políticos e na menor preferência dada ao regime democrático em termos comparativos.
Estes dados refletem em boa parte o processo de fragilização das bases institucionais democráticas no país, sobretudo nas últimas décadas, e revela a gravidade das conseqüências, para o sistema representativo, causada pelas mudanças ocorridas no período.