Opinião Pública – Vol. 22, Nº 3 2016
Artigos desta edição
Autores: Marcelo Baquero e Rodrigo Stumpf Gonzalez
Este artigo busca avaliar a presença de uma democracia inercial no Brasil, em que as assimetrias entre economia e política produzem uma cultura política passiva e anômica. Tal situação possibilita que as políticas sociais e econômicas sigam um padrão que pouco se modifica. Se, num contexto de mudanças, as coisas precisam mudar para que fiquem iguais, então se pode esperar que, num contexto de (re)democratização com inércia, as instituições mudem, sem, no entanto, alterar, numa direção positiva, as normas, os valores e as crenças normativas da população em relação à democracia. Para analisar essa proposição serão utilizados dados demográficos e socioeconômicos, avaliados ante a evolução da confiança nas instituições, governantes e na democracia no período 2002-2014, a partir de dados do ESEB. A conclusão é de que o período de desempenho econômico favorável não permitiu a consolidação de uma cultura política democrática, com rápida deterioração do apoio às instituições e aos governantes a partir da crise econômica.
Autores: Luciana Fernandes Veiga e Steven Dutt Ross
Este artigo analisa os determinantes da avaliação econômica retrospectiva sociotrópica na eleição presidencial no Brasil em 2014, com base: a) no conhecimento que o eleitor possui a partir de informação objetiva da economia; b) no conhecimento que o eleitor possui a partir de sua experiência vivida/sensação de mobilidade social; c) a sua afetividade partidária; d) a sua identidade ideológica. Nossa contribuição foi mostrar que: a) ter conhecimento/informação objetiva da economia não tem impacto na avaliação da economia; b) o conhecimento advindo da experiência vivida, identificado aqui como sensação de mobilidade social, não impacta na avaliação da economia no sentido esperado – mais ascensão, mais tendência de avaliação positiva; c) a afetividade partidária, por sua vez, demonstrou forte impacto na avaliação da economia. O artigo usa dados do CSES/Eseb – Estudo Eleitoral Brasileiro.
Autores: Maria do Socorro Sousa Braga e Gabriel Ávila Casalecchi
Nas últimas duas décadas do século passado a democracia estabeleceu-se como regime hegemônico em várias partes do mundo. Teoricamente, essas democracias funcionam segundo preceitos constitucionais originados de consenso normativo resultante de negociação entre forças políticas que legitimam, assim, o processo de escolha de governantes. Ou seja, deve haver consenso mínimo sobre as regras subjacentes à escolha dos governantes e, posteriormente, adesão aos resultados de todos os atores envolvidos. Consequentemente, um importante sinal do quão legítima é a democracia de um país é o comportamento dos seus perdedores. Diante desse princípio democrático, este artigo parte de duas questões, tendo a democracia brasileira como estudo de caso. A primeira busca responder se a derrota nas urnas em 2014 afetou os graus de satisfação e de apoio dos perdedores em relação à democracia brasileira. Ou seja, perder as eleições fez com que os eleitores derrotados extrapolassem a crítica ao governo eleito, alcançando o próprio regime democrático e, portanto, as “regras do jogo”? Já a segunda indagação, de cunho mais explicativo, procura identificar quais condições são capazes de intensificar as características que podem aumentar ou diminuir o gap entre vencedores e perdedores no que se refere ao apoio ao regime democrático. A principal conclusão é a de que os perdedores das eleições são mais insatisfeitos com o desempenho da democracia do que os vitoriosos, porém não existem diferenças no que tange à adesão à democracia. Esse resultado ocorre mesmo quando controlado por diferentes características demográficas, sociais e individuais, entre elas a avaliação do governo Dilma Rousseff e a rejeição ao PT.
Autores: Elizabeth Balbachevsky e Bruno Wilhelm Speck
Neste artigo analisamos o impacto da identificação partidária sobre o comportamento eleitoral no Brasil. Usamos dados do Eseb realizado em 2014 com uma amostra representativa de eleitores de âmbito nacional. Em relação aos outros trabalhos a respeito do impacto da identificação sobre o voto, inovamos em dois aspectos. Primeiro, não nos limitamos à análise do voto para presidente, mas incluímos o voto para todos os cargos em disputa em 2014. Segundo, mostramos que a identificação partidária não atua da mesma forma sobre todos os eleitores identificados com um mesmo partido. Mostramos que partidários do PT são mais coerentes no seu voto para presidente quando têm maior nível de instrução, ao passo que os partidários do PSDB são mais fiéis na mesma questão quando têm baixa instrução. Da mesma forma, petistas são fiéis na hora de votar no presidente, enquanto os pessedebistas votam com seu partido na hora de escolher governadores e senadores. Finalmente, nossa análise identificou um padrão complexo entre as variáveis educação, aqui tomada como proxy dos recursos cognitivos do eleitor, identidade partidária e decisão de voto. Essa última contribuição leva a discussão sobre a identificação partidária no Brasil para além das questões sobre sua presença ou ausência no eleitorado, e sua relevância para entender a decisão de voto, que são as abordagens dominantes na literatura que trata do tema.
Autores: Julian Borba, Ednaldo Ribeiro e Yan Carreirão
O artigo investiga, a partir dos dados do Estudo Eleitoral Brasileiro, os sentimentos partidários dos eleitores brasileiros em 2014 e suas relações com dimensões atitudinais e comportamentais. Ênfase especial é dada ao antipetismo, ou seja, ao sentimento negativo que parcela crescente do eleitorado vem manifestando em relação ao PT. Além de analisar a evolução dessas disposições entre 2002 e 2014, o artigo procura identificar o perfil sociodemográfico dos eleitores antipetistas e o impacto dessas disposições negativas sobre variáveis atitudinais (estatismo, igualdade e democracia) e sobre o voto. Os resultados apontam para o decréscimo generalizado dos sentimentos positivos em relação aos partidos, com destaque para o PT. Também indicam efeitos reduzidos do antipetismo sobre atitudes políticas, mas sua forte influência sobre padrões de comportamento eleitoral.
Autores: Denise Paiva, Silvana Krause e Adriana Paz Lameirão
Há um grande número de estudos sobre o Partido dos Trabalhadores, abordando desde a sua origem, organização e dinâmica interna até a sua relação com o eleitorado. A legenda, ao longo dos anos, tem apresentado os maiores índices de preferência partidária vis-à-vis as demais, fenômeno esse conhecido como petismo. O artigo propõe-se a analisar a outra face desse fenômeno: a rejeição que parcela do eleitorado tem demonstrado a esse partido, o antipetismo. Queremos saber quem é o eleitor antipetista, com base nos dados do Estudo Eleitoral Brasileiro (Eseb) 2014. Nosso objetivo principal é identificar e caracterizar o perfil do eleitor antipetista, por meio da estatística descritiva, e estabelecer uma comparação com o eleitor antipartidário. Em seguida, recorrendo a um modelo de regressão logística ajustado, detectar o impacto de algumas variáveis sobre a probabilidade de o entrevistado ser identificado como antipetista. Os resultados mostraram que a avaliação negativa do desempenho do governo da presidente Dilma Rousseff e o voto nos candidatos do PSDB nas eleições presidenciais são variáveis determinantes para um eleitor ser antipetista.
Autores: Oswaldo Amaral e Marcela Tanaka
Apesar da importância das disputas para os governos estaduais na política brasileira, pouco se sabe a respeito dos fatores que levam às escolhas dos eleitores para esses pleitos. Existem fatores comuns que ajudam a explicar a escolha dos eleitores em todo o país para os governos estaduais? Qual é o peso da avaliação do governo federal e da percepção sobre o desempenho da economia do país nas eleições nas unidades da federação? Candidatos à reeleição ou apoiados pelo governador são beneficiados pela avaliação positiva do governo federal? A preferência partidária importa na hora de escolher os candidatos a governador? Essas são as perguntas que buscamos responder, ainda que de maneira preliminar, neste artigo. Para isso, realizamos análises multivariadas a partir dos dados de nível individual produzidos pelo Estudo Eleitoral Brasileiro (Eseb) de 2014. Os resultados indicam que a preferência partidária, assim como nas eleições presidenciais, é importante elemento de escolha nos pleitos para os governos estaduais, e que a disputa entre PT e PSDB no plano nacional acaba por influenciar também o âmbito estadual.
Autores: Antonio Teixeira de Barros e Cláudia Regina Fonseca Lemos
O artigo analisa, com base em referencial sociológico, as lutas simbólicas na arena midiática acerca das controvérsias relacionadas à Proposta de Emenda Constitucional que proibia o Ministério Público (MP) de conduzir investigações criminais, a chamada PEC 37. O objetivo é compreender como os diversos atores interessados no assunto travaram o debate, levando o tema a chegar às manifestações de junho de 2013. O material empírico analisado inclui 351 textos jornalísticos, entrevistas e questionários com os representantes do MP dos estados e da União, além do Conselho Nacional do Ministério Público e das associações da categoria. As principais conclusões indicam que prevaleceu na imprensa o enquadramento conferido pelo MP, ao adotar o slogan “PEC da impunidade”. A despeito da contra-argumentação de delegados de polícia e parlamentares, a visão do MP foi acolhida pela imprensa e pela opinião pública, abrindo caminho para incluir a derrubada da PEC entre as reivindicações das manifestações de junho de 2013.