Opinião Pública – Vol. 28, Nº 1 2022
Artigos desta edição
Autor: René Millán
O objetivo do artigo é mostrar o papel crucial que as ideias desempenham na mudança institucional, na formação de políticas públicas, e no agrupamento e orientação dos atores. Todos estes cenários envolvem processos de criação de ideias e discursos, de disputas sobre a solução de problemas e a legitimação ou não de decisões. O papel das ideias depende da nossa concepção da sua relação com as instituições, interesses e atores. E dos determinantes que apreciamos nas mudanças. O pressuposto promovido pela escolha racional de que são um meio instrumental de interesses limita a compreensão da complexidade dos processos políticos. Para justificar o seu papel, o artigo analisa várias escolas e autores em termos da tensão conceitual entre interesse e instituições; a relação entre ideias, mudança política e coligações; e o papel do discurso em relação a elas.
Autor: Pedro Jesús Pérez Zafrilla
Nos últimos anos, a opinião pública tem se preocupado com a polarização política. Alguns autores apontam a internet e as redes sociais como causa dessa polarização. Nesse contexto, este artigo aborda os diferentes usos que os indivíduos fazem da internet e que dão origem a diferentes formas de polarização. O artigo parte da revisão bibliográfica sobre as bases neuropsicológicas do comportamento político e a natureza da polarização política. Com base nisso, o artigo apresenta os modos como ocorre a polarização na internet, bem como os pressupostos morais e epistêmicos da polarização política. Diante dessas formas de polarização, o artigo aborda o conceito de polarização artificial. Este conceito visa explicar como os usos expressivos da rede geram uma percepção equivocada de polarização entre os usuários. Exemplos de polarização artificial são discursos incendiários, linchamentos virtuais ou postura moral. Como resultado, o artigo apresenta algumas indicações para desativar os processos de polarização artificial e construir um ambiente mais calmo na rede.
Autores: Pablo Ortellado, Marcio Moretto Ribeiro e Leonardo Zeine
Embora tenhamos muitas evidências anedóticas sobre a polarização política no Brasil, os estudos empíricos têm se concentrado, em grande parte, no padrão de voto. Partindo de duas séries históricas de pesquisas de opinião (Lapop e World Values Survey), investigamos o fenômeno da polarização política em quatro sentidos consagrados: polarização das opiniões sobre temas políticos, polarização das identidades políticas, alinhamento das opiniões com identidades e polarização afetiva. Verificamos que há polarização de opiniões sobre direitos dos homossexuais e sobre o divórcio, como processo e como estado, respectivamente. As identidades políticas também se polarizaram a partir de 2010, sobretudo entre os mais velhos e menos escolarizados, o que não implicou um aumento de alinhamento. Por fim, constatamos que, entre as pessoas engajadas, há polarização afetiva em torno de algumas identidades.
Autores: Mayra Goulart Silva, Paula Frias dos Santos e Luan Sudário da Silva
O objetivo do artigo é compreender como os indicadores sociais territorializados podem dar pistas sobre a ampliação da base eleitoral de Jair Bolsonaro em sua carreira como parlamentar e, posteriormente, como presidenciável, observando rupturas e continuidades nessa trajetória. O método utilizado será uma correlação entre o Índice de Desenvolvimento Social da cidade do Rio de Janeiro e o desempenho eleitoral espacializado do então candidato nas eleições de 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018. Nesse esforço, esperamos oferecer insumos àqueles que se debruçam sobre os seguintes questionamentos: qual o perfil do eleitor de Jair Bolsonaro ao longo de sua trajetória parlamentar? Houve mudanças nesse perfil? Como se deu a ampliação de suas bases eleitorais no processo de construção de sua candidatura à presidência da República?
Autores: Marcio Grijó Vilarouca, Américo Oscar Guichard Freire e Philippe Chaves Guedon
O presente artigo investiga os processos informais de recrutamento e seleção de candidatos a vereador na cidade do Rio de Janeiro com base em entrevistas com lideranças partidárias e por meio da análise complementar de dados sobre coligações, votos e financiamento de campanha. A partir do exame prévio dos incentivos do sistema eleitoral e das dinâmicas intrapartidárias locais, exploramos as estratégias utilizadas pelas lideranças para compor e hierarquizar as chapas eleitorais, partindo do pressuposto de que ideologia e presença de diretórios permanentes (ou de comissões provisórias) têm impactos no grau de inclusividade dos selectorates e nas estratégias de recrutamento. Em termos alegóricos, o jogo das nominatas representaria o processo informal de competição e cooperação entre os agentes políticos durante o interregno pré-eleitoral com vista a obter representação parlamentar.
Autores: Maria Paula Almada, Paula Karini Amorim, Maria Dominguez C. Pinho e Claudia Regina de Sousa e Silva
O presente artigo tem como objetivo comparar a transparência online das contas públicas nos portais do governo brasileiro durante as gestões de Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Considerando que as agendas e políticas adotadas pelos diferentes governos podem refletir na transparência, nossa hipótese é a de que o nível da transparência online do governo Dilma Rousseff é maior que o do governo Jair Bolsonaro. Aplicou-se, em 2016 e em 2020, uma metodologia de pesquisa voltada para a análise qualitativa, quantitativa e comparativa da transparência online das contas públicas. O estudo revelou que, na gestão Rousseff, o nível de transparência do Executivo brasileiro foi considerado avançado (97%), ao passo que, durante o governo Bolsonaro, esse nível de transparência brasileiro é moderado (73%). Os resultados são discutidos a partir de fatores contextuais e normativos brasileiros.
Autor: Marianna Sampaio
O artigo analisa o Plano Geral de Atuação (PGA) do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP), instrumento que fixa as metas prioritárias anuais de desempenho de promotores e procuradores, examinando (i) a relação entre política institucional e independência funcional e (ii) a visão dos promotores e procuradores acerca do papel do MP e a implicação disso para a judicialização da política. Trata-se de um estudo de caso múltiplo com metodologia qualitativa. As metas dos PGAs foram classificadas e quantificadas. Foram também realizadas entrevistas semiestruturadas com integrantes do MP. Demonstra-se neste artigo que o PGA é concebido como um instrumento para tentar influenciar a agenda do Poder Executivo e que o estabelecimento eficiente de uma política institucional (i) depende da interpretação do conceito de independência funcional e (ii) poderia agravar o quadro de judicialização da política.
Autores: Cláudia Feres Faria e Isabella Lourenço Lins
O artigo analisa se e como as conferências e conselhos de saúde e de políticas para as mulheres em Minas Gerais interagem para formar um sistema participativo e deliberativo nestas duas áreas de política. O artigo avalia analítica e empiricamente (1) como os atores, os temas e as normas atuam enquanto conectores desses fóruns e (2) se essas conexões promovem um sistema integrado em cada área de política. Para investigar as conexões entre as conferências e os conselhos utilizamos quatro técnicas de pesquisa diferentes: observações das reuniões dos conselhos e das conferências, análise de documentos, survey e entrevistas. As técnicas foram mobilizadas para comparar estes dois casos contrastantes. Como resultado da análise comparativa, argumentamos que a infraestrutura legal e política na qual as áreas de políticas estão imersas induz os conectores a funcionarem de forma sistêmica. A política de saúde, mais previsível jurídica e institucionalmente do que a política para as mulheres, garante condições mais favoráveis para os atores coordenarem suas ações, para os temas serem debatidos e veiculados, assim como para as normas serem contestadas e legitimadas. Desta forma, afirmamos que os recursos político-institucionais são fundamentais para que os conectores conformem um sistema participativo e deliberativo nas duas áreas de política analisadas.
Autores: Matheus Gregorio Tupina Silva, Anna Carolina Raposo de Mello e Marislei Nishijima
Este artigo investiga a maneira como três portais de comunicação escrita (CNN, Fox News e BBC), vistos como politicamente partidários, enquadraram as notícias sobre Edward Snowden envolvendo questões sensíveis sobre cibersegurança. Sendo a mídia um ator influente na política nacional e internacional, importa conhecer como a mídia enquadra os fatos sobre informações de falhas de segurança na internet, sob disputa narrativa. Análises de sentimentos foram realizadas em centenas de artigos destes portais de livre acesso entre 2013 e 2018. Os resultados mostram sentimentos disseminados pela maioria das manchetes, enquanto textos mais neutros são encontrados no corpo das notícias.