Opinião Pública – Vol. 31, Nº 1 2025
Artigos desta edição
Autor: Lea Heyne
Por que os perdedores gostam menos da democracia do que os vencedores? O fato de o estatuto social ter um impacto no apoio à democracia é, embora empiricamente estabelecido, frequentemente ignorado na literatura. Este artigo analisa os efeitos do estatuto social subjetivo e objetivo nas expectativas e avaliações da democracia por parte dos cidadãos. Os resultados mostram que um estatuto baixo leva os cidadãos a valorizar as dimensões democráticas de forma diferente - preferem a justiça social aos critérios liberais. Além disso, os cidadãos com baixo estatuto também avaliam o desempenho do seu próprio sistema democrático em todas as dimensões de forma significativamente mais crítica do que os seus homólogos com estatuto mais elevado. Estes dois efeitos combinados criam uma maior “distância” entre as expectativas e as avaliações dos cidadãos de baixo estatuto, especialmente na dimensão social, tornando-os mais propensos à insatisfação democrática. Além disso, a posição social subjetiva tem um efeito significativamente mais forte do que a posição objetiva, apontando para a relevância das percepções de estatuto para as atitudes democráticas.
Autores: Marcelo de Souza Marques e Vanessa Marx
Desde o ciclo de protestos pelo qual passou o Brasil (2013-2016), temos observado mais claramente a presença de novos sujeitos coletivos em cena e discutido suas possíveis novidades. Neste artigo, abordaremos os coletivos culturais contemporâneos a partir de uma abordagem processual-relacional para refletirmos sobre o que pode ser compreendido como novidades nessas experiências organizacionais. Os dados da pesquisa nos permitiram destacar inovações concernentes à elaboração de novos padrões de interação com a esfera estatal, às múltiplas linguagens artístico-culturais e às múltiplas agendas. Além da revisão da literatura, a metodologia de pesquisa consistiu em um estudo qualitativo estruturado a partir da análise de entrevistas com ativistas e dos dados de um survey com coletivos culturais no Espírito Santo. Os resultados indicam que, embora os coletivos não representem um novo fenômeno sociológico, podem ser compreendidos como uma novidade na medida em que (re)surgem contemporaneamente resgatando métodos, formas e práticas organizacionais na demarcação do seu próprio modelo organizacional.
Autor: José Veríssimo Romão Netto
Apresenta-se, neste artigo, uma reflexão sobre as relações entre democracia e políticas culturais. Enfatiza-se que não há relação necessária entre políticas culturais e democracia, e que, em democracias, as políticas culturais assumem formas institucionais específicas de governança que envolvem a participação dos cidadãos ao longo do ciclo da política. Com apoio no arcabouço epistemológico do neoinstitucionalismo ideacional e a ferramenta da análise de conteúdo, analisam-se as ideias contidas nos programas de governo e discursos de vitória de Bolsonaro (2018) e de Lula (2022), bem como os contextos políticos e imagens desses momentos. Argumenta-se que as “convicções causais” em seus programas influíram diretamente no desenho organizacional do Ministério da Cultura, em ambos os governos (2018; 2022), e geraram duas imagens de políticas culturais: a cultura como medo e a cultura como esperança.
Autores: Arthur Ituassu, Marcelo Alves, Aline Lopes e Raul Pimentel
A eleição de 2018 trouxe novo recorde de renovação à Câmara dos Deputados. Quatro anos depois, 64% dos eleitos eram novatos ou estavam no fim do primeiro mandato. Essa renovação ocorreu em meio ao surgimento de atores políticos não tradicionais fortemente relacionados com as mídias digitais. Nesse contexto, o objetivo deste artigo é analisar como esse grupo renovador se relacionou com as ferramentas on-line no pleito de 2022. Fazemos isso a partir do debate equalização/normalização, que discute os efeitos das mídias digitais sobre a competição eleitoral. Investigamos as campanhas digitais do grupo renovador procurando sinais de equalização, a partir da análise estatística de interações nas mídias sociais e do investimento em anúncios digitais. Nossos resultados mostram que, em geral, a renovação está relacionada às mídias digitais, mas nem toda renovação pode ser considerada equalização.
Autores: Natália Martino e Raquel Magalhães
As ouvidorias objetivam o controle material dos atos do Estado. Para tanto, precisam ter algumas prerrogativas, como autonomia e participação social, de forma a se configurarem como agências de controle externo. Muitos desses órgãos, porém, foram construídos a partir do paradigma privado e lhes faltam tais prerrogativas. Este artigo parte dessa perspectiva teórica para começar a suprir uma lacuna de conhecimento acerca das ouvidorias penitenciárias no Brasil. Criadas a partir do início deste século, esses órgãos de controle penitenciário se espalharam pelo país, mas seus desenhos institucionais são variados e ainda desconhecidos da academia. Por meio de entrevistas, análise documental e organização de dados obtidos via Lei de Acesso à Informação propõe-se uma descrição de 19 das 21 ouvidorias estaduais, seguida de uma classificação delas em uma escala que vai do paradigma privado ao público.