Opinião Pública – Vol. 30, Nº 1 2024
Artigos desta edição
Autores: Frederico Batista Pereira e Felipe Nunes
As pesquisas de intenção de voto para presidente no primeiro turno de 2022 divergiram do resultado de domingo (2 de outubro), levando a críticas de que teriam sido cometidos erros. Este artigo examina uma explicação alternativa para o fato, segundo a qual mudanças de preferências ocorreriam entre as pesquisas e a votação. Embora impopular, a explicação tem respaldo na literatura com foco em dois processos: o voto estratégico e o alinhamento dos indecisos. Utilizando um experimento feito uma semana antes da eleição, mostramos que eleitores indecisos e de candidaturas menores apresentavam propensão a serem persuadidos por vídeos de campanha. Também utilizamos uma pesquisa feita às vésperas do pleito, para desenvolver modelos que identificam eleitores propensos a mudarem suas escolhas, de modo a ajustar a estimativa da votação. Os resultados sugerem que as mudanças tardias seriam um fenômeno mais do que plausível nas eleições brasileiras recentes.
Autores: Fabiano Santos, Rafael Moura, Camila Vaz e Yago Paiva
O objetivo deste artigo é avaliar se, e em qual medida, a desindustrialização da economia brasileira afetou a geografia do voto nos pleitos eleitorais das últimas duas décadas, em particular, nos interessando examinar a inflexão do voto petista. O trabalho considera a desindustrialização como um choque econômico exógeno que, alterando a renda e a natureza do emprego disponíveis nas localidades, afeta o apoio eleitoral ao partido nacionalmente incumbente. Nossas principais fontes de dados empíricos são: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE); e nossas unidades espaciais de análise, os municípios. Nossos resultados confirmam a hipótese de que a desindustrialização afetou negativamente a votação do Partido dos Trabalhadores. Ressaltamos, ainda, as características regionais de tal processo, fundamentais, sobretudo, à compreensão do resultado eleitoral de 2018. A originalidade do artigo está em preencher uma lacuna da literatura de estudos eleitorais ao tratar das mudanças estruturais no capitalismo brasileiro como vetor explicativo primordial.
Autores: Flávia Biroli, Luciana Tatagiba e Débora Françolin Quintela
Este artigo se insere no debate sobre as reações à política feminista. No Brasil, essas reações foram assumidas como diretriz política durante o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022). Nesse período, o contramovimento antifeminista teve acesso à gestão pública, ocupando cargos em um governo de coalizão convergente, isto é, uma aliança governista heterogênea, que não inclui grupos orientados para a promoção da igualdade de gênero. O estudo analisa quem foram os atores e os efeitos de sua atuação em três ministérios: Mulher, Família e Direitos Humanos; Saúde; e Educação. Foram coletados dados sobre trajetórias e posições dos atores na gestão, evidenciando as políticas em que estiveram envolvidos. Eles apontam para a relevância de atores conservadores evangélicos e católicos, aliados em ações para bloquear agendas feministas e propor políticas que afirmam a ordem familiar tradicional.
Autores: Flávio Contrera, Paulo Cesar dos Santos Gregorio, Bárbara Lima e Mércia Kaline Freitas Alves
O presente artigo tem como objetivo compreender a competição partidária no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral, na eleição presidencial brasileira de 2022, a partir da Saliency Theory. Assim, enseja contribuir ao discutir o poder explicativo desta teoria – desenvolvida com foco em manifestos de campanha – na campanha televisiva. Ao mobilizar técnicas de Análise de Conteúdo e de Análise de Redes Sociais, atestamos a extensão do alcance da teoria para o HGPE, espaço em que os partidos tendem, assim como nos manifestos, a enfatizar questões que são vantajosas para eles. Contudo, verificamos que esse alcance não se aplica ao escopo da interação com os oponentes na campanha eleitoral. Assim, não se pode argumentar que a estratégia da “ênfase seletiva” é empregada em detrimento da estratégia de “confrontação”. Explicando tal estratégia através do conceito de interação estratégica, mostramos que a eleição de 2022 configura-se em uma rede com dois espaços de competição: o primeiro ocupado por PT e PL; e o segundo opondo candidaturas da “terceira via” ao PT e ao PL.
Autores: Marcela Barba e Michele Massuchin
Atenta à relevância evangélica no cenário político nacional, esta pesquisa busca identificar como candidaturas são atravessadas por discursos, apelos e acenos de cunho religioso. Para tanto, analisam-se os conteúdos publicados no Facebook pelos candidatos a prefeito, cujos nomes de urna incluíam o termo pastor, durante o período eleitoral de 2020. Somam-se à pesquisa os posts de candidatos sem nomenclatura religiosa, a fim de verificar as distinções e semelhanças entre os grupos. Deste modo, são analisados, com base na análise de conteúdo, 5035 posts. Como resultados, foram identificados elementos que os aproximam, como temas de políticas públicas. Já os acenos religiosos e temas ético-morais são mais valorizados pelos pastores. Ao se focar nas especificidades do grupo eclesiástico, verifica-se que a ênfase no atravessamento religioso se diferencia de acordo com a classificação ideológica partidária.
Autores: Marcelo Alves dos Santos Junior e Afonso de Albuquerque
Este artigo contribui com a pesquisa de comunicação política ao propor uma classificação ideológica de fontes informacionais de acordo com a atenção multipartidária no Brasil. Para isso, reproduzimos a metodologia de classificação da atenção midiática multipartidária no Twitter (Benkler; Faris; Roberts, 2018; Giglietto et al., 2019). Extraímos uma base de dados original de 2,95 milhões de tweets, postados entre 2019 e 2020 por 1.346 usuários. Os resultados apontam para uma realidade mais complexa do que o conceito clássico de paralelismo político descreve. A maior parte das fontes informacionais distribui sua atenção entre diversos grupos partidários. Sites insulares são menos citados e reproduzem identidades político-ideológicas mais amplas, sem alinhamento ou audiência exclusiva de um partido. Ao final, debatemos as implicações dos resultados para a teoria do paralelismo político.
Autores: Tatiana Dourado, Sabrina Almeida e Victor Piaia
Este artigo investiga a presença de atores, de conspiração e a moderação em conteúdos on-line com alegações infundadas de fraude eleitoral publicados durante as eleições municipais de 2020 no Brasil. Partindo do entendimento de que o acirramento dos conflitos entre as elites políticas influencia o sistema político e, por conseguinte, a estabilidade das instituições e normas democráticas, o artigo usa um corpus de 1.426.687 posts do Facebook, YouTube e Twitter para examinar a posição de influência de quem publica sobre contestação eleitoral, entender o espraiamento desses conteúdos entre meios e as características que dão a eles um apelo conspiratório. Mostra que essa pauta é mobilizada por políticos e outros líderes de opinião da direita radical. A maioria desses conteúdos se baseia em opinião política, sem menção a fontes, e tem caráter eminentemente conspiratório.
Autor: André Borges
Este artigo busca compreender a reorganização da direita brasileira em reação aos governos do Partido dos Trabalhadores (PT) (2003-2016). Argumenta-se que a nova direita nas arenas eleitoral e legislativa é composta por duas vertentes distintas: a nova direita evangélica, que surgiu como parte de uma reação às mudanças progressistas nos valores e nas políticas públicas e distingue-se do resto da direita política pelas suas posições ultraconservadoras em questões morais; e a outra vertente da nova direita emergiu de movimentos liberais, anti-PT e anticorrupção, que se organizaram durante uma série de crises políticas e econômicas entre 2014 e 2018. Embora pesquisas anteriores tenham enfatizado as agendas ultraliberais desses movimentos, o que distingue essas forças políticas é seu perfil anti-establishment. Para demonstrar esses argumentos, o artigo recorre à análise dos programas partidários e a dados de survey realizados com os deputados federais em 2019.
Autores: Leonardo Barros Soares, Catarina Chaves Costa, Marina de Barros Fonseca, Victor Amaral Costa, Ana Paula Alvares Costa e Yasmin Nascimento Moita
O presente artigo visa dar uma resposta à seguinte questão: por que algumas Terras Indígenas são demarcadas enquanto outras não? Primeiramente, arrolamos as variáveis institucionais e não institucionais sugeridas pela literatura especializada que podem influenciar o processo demarcatório. Em seguida, aplicamos a técnica de Qualitative Comparative Analysis (QCA) sobre um crisp set composto por 40 casos de Terras Indígenas em diversas regiões do país. Demonstramos que: 1) a coesão intragrupal das lideranças indígenas, em conjunção com atos de mobilização e protesto indígena, respondem pela maioria dos casos de demarcação verificados; e 2) possibilidade de obtenção da demarcação por uma via composta por fatores puramente burocráticos. Concluímos apontando para a importância de que o Estado brasileiro, no tratamento com os distintos grupos indígenas do país, não atue para agravar suas possíveis divisões internas, sob pena de neutralizar um fator crucial para a garantia dos direitos territoriais desse segmento populacional.
Autores: Rodrigo Rossi Horochovski, Ivan Jairo Junckes e Neilor Fermino Camargo
O artigo analisa dados de candidaturas e prestação de contas das eleições de 2014 e 2018 no Brasil para responder à seguinte pergunta: quais são os efeitos da proibição do financiamento eleitoral empresarial e da introdução do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) sobre as redes de financiamento eleitoral? Coletamos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e os analisamos com a metodologia da Análise de Redes Sociais e tratamentos estatísticos complementares. Como resultado, confirmamos nossas três hipóteses: (H1) a topologia da rede de financiamento eleitoral manteve-se altamente assimétrica; (H2) sem as empresas, os partidos políticos aumentaram sua centralidade na rede de financiamento; e, (H3) o sucesso eleitoral manteve-se fortemente relacionado à ocupação de posições centrais na rede de financiamento, não havendo alterações significativas nos perfis de partidos e candidatos mais competitivos.
Autores: Fabiana Luci de Oliveira, Luciana Gross Cunha e Luciana de Oliveira Ramos
O artigo trata da imagem pública do Supremo Tribunal Federal (STF), buscando identificar quais fatores ajudam a explicar a confiança pública nessa instituição, a partir de dados de levantamento de opinião pública (survey), que entrevistou uma amostra de 1.650 brasileiros entre novembro de 2020 e janeiro de 2021. Dialogando com a literatura sobre confiança na Suprema Corte norte-americana, foram testadas quatro hipóteses explicativas para a confiança no STF, considerando: 1) o nível de familiaridade com o STF; 2) o nível de lealdade ao STF; 3) a percepção de que os ministros são distintos da política convencional; e 4) a percepção de desempenho do STF nos casos relativos à Covid-19. Os resultados do modelo de regressão logística levaram à conclusão de que no caso do STF, assim como no da Suprema Corte norte-americana, a confiança parece ser explicada por uma combinação de avaliações de curto e de longo prazo da instituição, embora aqui, diferente do que acontece lá, as percepções de curto prazo têm maior poder preditivo, impactando mais fortemente a confiança institucional.
Autores: Thiago Moreira e Lucio Rennó
As análises correntes deixam explícito que o candidato Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal) conseguiu galvanizar um conservadorismo latente da população, à espera de uma liderança capaz de traduzir anseios pouco representados nas disputas presidenciais. Esses estudos padecem de um problema de endogeneidade: afinal, Bolsonaro também seria capaz de deixar o eleitorado mais conservador? Para iluminar essa questão, utilizamos uma técnica de matching, a fim de produzir um arcabouço que minimize vieses de variável omitida e problemas de simultaneidade. Como resultado, propomos que a vinculação ideológica dos eleitores com Bolsonaro não reside somente na capacidade de atração da parcela conservadora do eleitorado, mas na mudança de posicionamento dos eleitores ao longo do pleito para se alinhar com as ideias expostas pelo então candidato, o que chamamos de "efeito Bolsonaro".
Autores: Ivan Daniel Müller e Luciano Fedozzi
O presente artigo analisa a trajetória do Orçamento Participativo (OP) de Porto Alegre (1989-2022), buscando identificar o caráter das mudanças ocorridas nesse modelo de gestão participativa. A partir do escopo teórico proposto por Charles Tilly (2013) para avaliar a dinâmica histórica dos regimes democráticos, são adotadas categorias que permitem adaptar essa abordagem para a análise das mudanças que ocorreram no longo prazo dessa instituição participativa. O artigo propõe um modelo de análise capaz de identificar períodos distintos na vida do OP porto-alegrense. A partir de fontes secundárias, constituídas por dados oficiais da Administração Municipal e por pesquisas acadêmicas sobre esse processo participativo, o estudo demonstra que a dinâmica de participação perdeu características democratizantes ao longo do tempo, direcionando essa instituição para um caminho contrário, de caráter desdemocratizante.
Autores: Paolo Ricci, Larissa Rodrigues Vacari de Arruda, Lucas Massimo e Jaqueline Porto Zulini
Qual o impacto do Código Eleitoral de 1932 sobre o governo representativo? Respondemos à pergunta, analisando dados inéditos sobre três dimensões constitutivas do governo representativo: participação eleitoral, competição política e perfil das elites políticas. Concluímos que o governo representativo mudou substantivamente o formato da participação política, mobilizando um número expressivo de eleitores; profundamente a representação política, dando acesso às oposições; limitadamente as elites políticas em seus atributos biográficos, ainda que de forma mais acentuada em termos da circulação delas. Os achados do artigo nos levam a defender que esse período histórico deve ser mais bem estudado, considerando-se que ele compartilha o princípio fundador do governo representativo: a seleção dos representantes por meio de eleições, mesmo sem democracia.
Autores: José Teles e Frederico Castelo Branco
A polícia está entre os braços mais visíveis do estado. No entanto, sabemos pouco sobre a relação entre contatos com a polícia e atitudes políticas. No Brasil, as abordagens policiais são centrais na segurança pública desde o final da década de 1990. Essas abordagens frequentemente violam direitos civis. Utilizando dados de painel representativos da cidade de São Paulo, investigamos se ser abordado ou ser abordado à mão armada afetam a satisfação com a democracia. Para realizar essa análise, aplicamos o modelo panel match, que combina diferenças-em-diferenças com matching. Também testamos um mecanismo causal que relaciona as abordagens com a satisfação com a democracia por meio das percepções de justiça procedimental da polícia. Nossos resultados indicam que as abordagens à mão armada reduzem a satisfação com a democracia por meio da redução das percepções de justiça procedimental.
Autores: Marcos Leite De Matos Todt e Rafael Machado Madeira
Qual é o espaço existente para ideias pós-desenvolvimentistas e baseadas na sustentabilidade forte nos programas de governo apresentados por candidaturas de esquerda no Brasil contemporaneamente? Com base nessa questão, analisamos as propostas dos partidos de esquerda que apresentaram candidaturas próprias na eleição presidencial de 2018 e entrevistamos filiados a esses partidos. As evidências apontam que, com exceção parcial do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), a esquerda partidária brasileira se limita a pensar alternativas dentro do paradigma desenvolvimentista. Embora o programa do PSOL, em 2018, tenha enfoque desenvolvimentista, a parte dedicada ao meio ambiente contém propostas referenciadas no debate internacional sobre alternativas ao desenvolvimento, o que indica que, nesse partido, a sustentabilidade forte tem condições de (ao menos) disputar espaço com o desenvolvimentismo.
Autores: Renata Mirandola Bichir, Sergio Simoni Junior e Ursula Dias Peres
A partir das lentes da governança multinível, este artigo contribui para o debate acerca das consequências do federalismo brasileiro sobre as políticas sociais, focando no Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Metodologicamente, o artigo inova ao analisar indicadores de desempenho dessa política no âmbito municipal, baseado em modelos de regressão multinível, com variáveis explicativas referentes à governança orçamentária, às capacidades estatais e interações socioestatais dos níveis vertical e horizontal, bem como dimensões locais, além de controles socioeconômicos e demográficos. Os municípios brasileiros são nossa unidade de análise, e o ano final do Pacto de Aprimoramento da Gestão Municipal, 2017, é a referência temporal. Os resultados indicam a importância dos diferentes níveis para explicar a performance municipal na provisão dos serviços da assistência social e, particularmente, especificam o espaço decisório dos entes subnacionais em uma política pública nacionalmente regulada, permitindo abrir novas linhas de investigação.
Autores: Huáscar Pessali, Elizandra Flávia Araujo e Rubia Thieme
O Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) com seus órgãos participativos está em funcionamento desde 2006. Os conselhos locais são seus ramos finais. Sua institucionalização tem sido mais ligada à criação legal do que à sua operação regular. À luz disso, coletamos evidências de suas atividades entre 2018 e 2022 no Paraná. Este período é particularmente adverso para os conselhos diante do forte viés antiparticipativo do governo federal entre 2019 e 2022, e da pandemia de COVID-19. Sua institucionalização continuou ou sucumbiu? Três oscilações de atividade foram encontradas. Primeiro, a atividade aumentou em 2019, caiu drasticamente em 2020, e em 2021 recuperou os níveis de 2018. Conselhos com laços mais fortes com o SISAN, instrumentos formais, em municípios maiores e naqueles com melhores capacidades estatais mostraram uma institucionalização mais consistente.
Autores: Bruna Eloy de Amorim e Drielli Peyerl
Neste artigo, investigamos o discurso soberanista brasileiro sobre a Amazônia, analisando como ele reflete e molda as políticas do Estado brasileiro para a região. Para isso, utilisamos a Análise de Conteúdo e a Análise do Discurso (particularmente a Abordagem Argumentativa desenvolvida por Maarten Hajer), a fim de verificar declarações sobre a Amazônia proferidas por representantes brasileiros no período de 1972 a 2021. Essa combinação metodológica possibilitou a identificação das principais linhas narrativas que contribuíram para legitimar o discurso soberanista, o qual se fundamenta em uma ameaça estrangeira recorrente à floresta. Concluímos que a incorporação desse discurso por diferentes grupos sociais permitiu que sucessivos governos priorizassem interesses geopolíticos e de segurança nacional na formulação de políticas para região, frequentemente em detrimento de problemas socioambientais locais.
Autores: Fernanda Rios Petrarca e Carlos Henrique Filgueiras
Este artigo analisa os usos que a operação “Lava Jato” fez das mídias sociais para promover tanto a adesão social ao projeto político-jurídico empreendido pela referida operação, quanto transformar indícios de corrupção em “maior escândalo já visto no país”. O universo empírico que serve de base para essa pesquisa consiste no conjunto de postagens realizadas, através das plataformas digitais, em especial o Facebook, das contas pessoais dos procuradores da “Lava Jato”, com o objetivo de examinar os quadros interpretativos da realidade que ela oferece e como isso se tornou um recurso para promover credibilidade e engajamento público. A análise permitiu evidenciar dois aspectos centrais. De um lado, a retórica populista se apresentou como o princípio mais geral que organizou os enquadramentos produzidos. De outro, o voluntarismo político, como ideologia do Ministério Público, foi o combustível para que o populismo jurídico se tornasse a gramática moral e política da Lava Jato.
Autores: Adrian Gurza Lavalle, Hellen Guicheney e Carla de Paiva Bezerra
Argumentamos que regimes de normatização estadual ampliam a presença territorial e fortalecem a operação dos conselhos gestores de políticas nos municípios sob sua jurisdição. Examinam-se três áreas de políticas que correspondem a tipos de conselhos com padrões de difusão territorial e produção de decisões conhecidos e relacionados à regulação federal: Patrimônio, Meio Ambiente e Assistência Social. Os resultados de regressões por área confirmam as hipóteses: os efeitos esperados dos regimes ocorrem e o fazem com maior intensidade em conselhos pouco regulados pela União. Porém, também sugerem que tal relação é mais acurada para os conselhos sob baixa e alta regulação federal, a qual perde força para aqueles em posição intermediária. Nesses casos, fatores locais dos municípios relativos ao porte, às pressões sociais ou às capacidades técnico-administrativas também ganham relevância.
Autores: Catarina de Melo, Mônica Dias Martins, Jakson Alves de Aquino e Gaudêncio Material Alves
A Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) tem sido vitoriosa em todas as eleições presidenciais, desde a independência do país, e tem defendido uma política de construção da nação moçambicana pela superação da cultura tribal e do pensamento colonial. O objetivo deste artigo é verificar a relação entre apoio à FRELIMO, identidade étnica e identidade nacional. Análises de regressão revelam que, embora os apoiadores da FRELIMO tenham mais forte o sentimento de pertencimento à nação, quando controlada pela província dos entrevistados, a identidade étnica pouco influencia no nacionalismo e no apoio à Frente. Esta pesquisa se utiliza de dados do Afrobarômetro para análise da relação entre etnia e política em Moçambique, algo altamente relevante para a construção nacional em um país multiétnico.
Autores: Ana Regina Villar Peres Amaral, Marcus Vinicius Chevitarese Alves e Symone Maria Machado Bonfim
Este artigo analisa a representação política pela ótica de gênero. O objetivo é investigar se o aumento na ocupação de cadeiras por mulheres estende-se a outras dimensões. A hipótese principal é a de que a representação feminina na produção legislativa brasileira é baixa, assim como a aprovação de matérias de interesse das mulheres, embora a ocupação feminina de espaços de poder venha crescendo dentro do parlamento. A partir de um modelo constituído por quatro dimensões (formal, descritiva, simbólica e substantiva), desenvolve-se a metodologia com três indicadores: composição do parlamento, produção legislativa e espaços de poder. Os resultados indicam aumento da produção legislativa de autoria feminina e em proporção superior ao número de cadeiras, mas isso não se traduziu em maior aprovação de normas relevantes e/ou substantivas, nem na ocupação de espaços de poder nas Casas Legislativas.
Autor: Eric Nogueira Andrade
O sistema eleitoral misto é frequentemente apontado como um importante arranjo institucional que propicia estabilidade com proporcionalidade. Não raramente, é associado à solidez da democracia alemã e assim indicado como referência para reformas em outras democracias. Uma análise sobre o impacto político desse modelo eleitoral nas eleições alemãs desde 1949 expõe, no entanto, um contínuo debate sobre a necessidade de reformas. Por meio de um estudo de caso da Alemanha, este artigo examina os efeitos da adoção do modelo misto por compensação sobre a proporcionalidade e sobre a competição partidária. Em especial, destaco dois elementos pouco difundidos: o voto dividido e o efeito contaminante. A análise empírica demonstra que a combinação dos dois votos traz inúmeras complicações para o sistema político alemão devido aos resultados imprevisíveis em relação à proporcionalidade.
Autores: Manoel Leonardo Santos, João V. Guedes-Neto, Asbel Bohigues e Breno A. H. Marisguia
A escala esquerda-direita é uma boa proxy das opiniões das elites parlamentares da América Latina em questões econômicas e morais? Este artigo responde a essa questão usando duas estratégias: Análise de Componentes Principais e análises de regressão. O resultado mostra que quanto mais à direita no espectro ideológico, mais os parlamentares são, coerentemente, a favor do liberalismo econômico. Mas, contraditoriamente, mostram um tipo de liberalismo estranho: liberal na economia e conservador em liberdades individuais. Esse conservadorismo, em termos de valores morais, é fortemente determinado pela religiosidade.